segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Um ministro afinado com os empresários

Por Mariana Martins e Cristina Charão, do Observatório do Direito À Comunicação, via Observatório da Imprensa em 11/12/2009

Exatamente uma semana antes da abertura da 1ª Conferência Nacional de Comunicação, que acontece na segunda-feira (14/12), em Brasília, o ministro das Comunicações, Hélio Costa, expôs a sua análise sobre a conjuntura das comunicações no país. Costa participou do programa de entrevistas da TV Cultura Roda Viva, e falou de praticamente todos os temas sobre os quais o ministério tem sido cobrado publicamente. No geral, as respostas do ministro deixam claro as afinidades de Costa com a pauta do empresariado das comunicações.

Em alguns casos, o ministro das Comunicações fez declarações que poderiam ser postas na boca de porta-vozes do setor empresarial. Por exemplo, o ministro classificou como "relativamente pequena" a quantidade de reclamações de usuários de telecomunicações quanto à qualidade dos serviços, tanto de telefonia quanto de internet. "Tivemos 16 milhões de reclamações em 210 milhões de linhas. Isso não é muito", afirmou. Em seguida, defendeu os problemas nas centrais de atendimento ao cliente, alvo da fiscalização dos órgãos de defesa do consumidor do Ministério da Justiça, que tem aplicado multas pesadas às operadoras de telefonia: "As empresas têm mais de 100 mil funcionários em call centers tentando receber as reclamações. Mas não podemos querer que as empresas respondam em um minuto uma reclamação e, em função disso, até levarem uma multa milionária". Ainda segundo o ministro, este é um problema mais presente nas operadoras de celular.

O ministro também tentou contemporizar problemas recorrentemente denunciados e comprovados ao longo dos anos por pesquisadores e organizações da sociedade civil. Declarações como a de que ele não consegue achar nos arquivos do Ministério das Comunicações "um político que seja integralmente `dono´ de uma rádio ou de uma TV" e também que a Constituinte de 1988 todas as oportunidades para rever os critérios de concessão, mas ela não quis discutir a questão da propriedade cruzada, soam até estranhas vindas da maior autoridade do principal órgão regulador do setor.

Dois pesos e duas medidas

Contrariando o que dizem os radiocomunicadores comunitários e também informações do próprio ministério, que apontam a existência de processos de legalização de emissoras comunitárias que há dez aguardam por resposta, Costa afirmou que em 180 dias pode-se conseguir uma autorização para colocar no ar uma rádio comunitária. A afirmação foi feita quando o ministro expunha as razões pelas quais ele é contrário à descriminalização das rádios "piratas". Segundo ele, os grupos que colocam no ar rádios sem autorização agem de má fé, já que o prazo para a legalização seria razoável.

Já com relação ao projeto de lei de sua autoria que propõe que as concessões de rádios com potência de até 50 KW e as de emissoras de TV que não são cabeças de rede possam ser repassadas a terceiros ou ter sua composição acionária modificada sem autorização prévia do Poder Executivo e do Congresso, desde que não possuam acionista estrangeiro (PLS 222/05), Costa falou que a proposta que fez, há cinco anos, quando chegou ao Congresso, tinha por objetivo justamente resolver a questão da demora nos procedimentos no Ministério das Comunicações – demora que, antes, ele havia negado existir na legalização das emissoras comunitárias. "Tinha 40 mil processos para serem analisados. A sugestão veio daí, para simplificar os procedimentos".

PNBL

Sobre a interiorização das telecomunicações, respondendo a perguntas dos telespectadores, Costa afirmou que, até o final deste ano, todos os municípios brasileiros deverão ter cobertura de telefonia celular de segunda geração. O ministro reconheceu que os serviços tanto de telefonia como de acesso à internet ainda são muito caros.

De novo, ao falar sobre os preços, Costa escorregou para a posição de porta-voz dos empresários, dizendo que a questão tem de ser resolvida com desoneração tributária. Só que, para o ministro, o problema é dos estados, que cobram ICMS muito alto.

Já em relação à internet, Costa disse que espera que o Plano Nacional de Banda Larga resolva a questão dos preços. Até agora, a proposta defendida pelo Ministério das Comunicações junto à Presidência da República, em oposição às propostas que estão sendo feitas pelo Ministério do Planejamento, caminha justamente na linha proposta pelo empresariado, de desoneração fiscal e investimento público para garantir a expansão das redes privadas.

Ainda sobre o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), o ministro declarou que governo não tem a pretensão de ser a última milha na banda larga, ou seja, que ele não será prestador na ponta do serviço. "Mas o governo quer garantir que as pequenas comunidades não fiquem desprovidas de banda larga. Os pequenos provedores, as empresas locais serão chamadas para participar", afirmou Costa.

A declaração do ministro tenta enviesar o debate sobre a formatação do plano, já que, na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou que não tem informações suficientes sobre as duas propostas de PNBL que existem dentro do governo e que, portanto, só posteriormente se posicionaria sobre o assunto.

Confecom

Como não poderia deixar de ser, a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) foi uma das pautas recorrentes da entrevista. Já de início, Costa lamentou mais uma vez publicamente o fato de a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert) e a Associação Brasileira de TVs por Assinatura (ABTA), dentre outras representantes do setor empresarial, terem deixado a Comissão Organizadora da Conferência. Contudo, reforçou que isso não trouxe prejuízo à Confecom, pois a Associação Brasileira de Radiodifusores (Abra) conseguiu representar o setor em todo o país, bem como a Telebrasil, cumpriu com esse papel também com relação às empresas de telecomunicações.

O ministro pontuou ainda que a Abra – que reúne os grupos Bandeirantes e RedeTV! – representa um segmento empresarial tão importante quanto a Abert (Globo e Record), e que esta, por sua vez, perdeu a oportunidade de participar. "Nada podemos fazer quando oferecemos a uma entidade a oportunidade de participar e ela não quer participar. Foi o que aconteceu com a Abert e com a ABTA", disse.

Ao falar sobre a saída da ABTA, Costa deixou transparecer o que o ministério aposta como a tônica da Confecom: um ambiente de negociação sobre algumas questões importantes para o setor privado. "A ABTA talvez [tenha saído] porque soubesse que estaríamos votando o PL-29 antes da Confecom. Talvez por isso ela tenha tido mais tranqüilidade, porque o novo marco regulatório para o setor de TV por assinatura deve ser votado antes da Confecom", disse o ministro.

Sobre um dos pontos mais polêmicos das discussões esperadas para a Confecom, que é o controle social dos meios de comunicação, Costa fez coro com os interesses empresariais e falou que esta era "uma das discussões mais temerosas" que surgiram ao longo do processo de convocação da conferência. Para o Ministro, é preciso evitar qualquer mudança nas comunicações brasileiras que leve a qualquer procedimento parecido com o de outros países da América do Sul. Segundo ele, existem setores dentro do Congresso que querem controle social da mídia, e até provocam essa discussão, fazem projetos de lei, mas para Confecom, Costa acredita em um certo "acordo de cavalheiros" entre as partes, na hora do voto – com 40% de votos dos empresários, 40% de votos das entidades sociais e 20% de votos do Poder Público – vai garantir que não seja discutido o controle social da mídia. "Pelo menos do ponto de vista do governo, não vamos levantar essa questão", garante o ministro.

Ainda sobre as propostas que o governo federal defenderá na Confecom, o ministro foi categórico ao dizer que as propostas apresentadas no site da conferência e saudada por parte da sociedade civil não empresarial, não representam as propostas do governo como um todo, mas apenas de setores do governo. Ou seja, novamente, como na discussão do Plano Nacional de Banda Larga, o Ministério das Comunicações deixa claro que não assume pautas nem propostas vindas de outros ministérios e que possam interferir nos rumos da concertação entre o órgão e o empresariado.

Hélio Costa falou ainda que espera da conferência resoluções sobre a sublocação da grade de programação das emissoras, o que, para ele, vem acontecendo muito com relação à conteúdos religiosos. Costa admitiu que é uma questão delicada e informou que o ministério está tentando coibir os excessos "com multas quase diárias". O ministro, entretanto, afirmou que não considera a sublocação das programações – mesmo entendendo que as emissoras têm obrigatoriedade de cumprir com uma grade de programação – uma infração grave a ponto de acarretar na perda da concessão.

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