O rádio está mudando com as novas tecnologias e os novos tempos. Para que o leitor entenda o que ocorre, vamos analisar alguns fatos que ocorreram nas duas grandes praças radiofônicas do Brasil.
Vejamos: a Rádio Antena 1 Lite FM do Rio, uma das mais conceituadas emissoras do segmento adulto contemporâneo do Rio de Janeiro é vendida para os Diários Associados transferir a Nativa FM, emissora do segmento popular, para os 103,7 MHz. No lugar da frequência original da Nativa, entrou a Rádio Tupi AM, que também transimitirá em frequência modulada. A Antena 1 promete, jura a seus fiéis ouvintes que começará a transmitir exclusivamente pelo seu site.
Em São Paulo, a FM 107,3 MHz, emissora educativa da Fundação Brasil 2000, é arrendada pelo grupo do jornal "O Estado de São Paulo" transferir sua Eldorado FM para os 107,3 MHz. Na antiga frequência, o grupo do "Estadão" fez uma parceria com o canal de tv ESPN Brasil - com quem já tem um acordo de conteúdo há 3 anos - a fim de replicar o sinal da Eldorado AM nos 92,9 MHz, mudando o nome para Estadão/ESPN.
O que ninguém sabe e nem se deu ao trabalho de avisar aos ouvintes: A ex-Brasil 2000, ou a rádio que havia assumido seu lugar antes da Eldorado entrar, está transmitindo dentro do site da Brasil 2000. Quero supor que para os ouvintes ddos antigos 107,3 MHz de São Paulo, seja uma grata surpresa em meio a essas mudanças, mas poderiam ao menos ter avisado.
Não chega a ser uma novidade, como o caro leitor pode observar, mas é o sintoma de que algo está para mudar para melhor ou para pior. A primeira emissora migrar e ficar exclusivamente na internet foram a Cidade FM e a Globo FM, ambas do Rio de Janeiro. A primeira foi alugada ou vendida e virou cabeça de rede da Oi FM, a primeira emissora "customizada" do Brasil; a segunda, simplesmente virou a repetidora da CBN AM, a exemplo do que já acontece há 15 anos na CBN paulistana.
Juntamente com esse fenômeno de "replicância" de rádios AM para o FM e da migração das FM para a internet, vemos também a multiplicação das chamadas emissoras "customizadas" - patrocinadas por empresas privadas e estatais de diversos segmentos que "colam" algumas de suas marcas ao nome das emissoras, passando estas a funcionar como ferramenta de divulgação, canal de vendas de serviços ou oferecem uma programação diferenciada para que o ouvinte sempre lembre dos produtos da mantendora, quando ouvir a rádio.
A Estadão/ESPN é apenas mais uma que adere a essa tendência: como a ESPN, que pertence ao grupo Disney, não tem mais a possibilidade de conseguir uma concessão de rádio no mercado de São Paulo - ainda que com um sócio brasileiro - resolveu se juntar a uma emissora jornalística e colocou seu projeto de ter uma rádio no ar. De fato, a parceria é ótima: trata-se de dois respeitáveis grupos de comunicação. Creio que o ouvinte só terá a ganhar, principalmente aqueles que não tem acesso á tv por assinatura, onde atua a ESPN. Penso eu que se trate de alguma estratégia da empresa americana, que possui estações de rádio ESPN em alguns países do mundo e, claro, nos EUA.
Agora é engraçado ver como as empresas de rádio americanas se comportam na terra deles e aqui fora. Nos EUA, por exemplo, a rede ESPN de rádio possui mais de 271 emissoras em todo o território nacional. Mais de 90% transmitem em AM. Eu disse AM. É claro que lá eles usam plenamente o sistema digital, algumas poucas emissoras usam canais secundários de áudio, a legislação de telecomunicações americana é muito amis clara e mais simples do que aqui e coisa e tal. Mas ali as emissoras AM locais são locais mesmo. Falam para a cidade e olhe lá. A coisa lá é altamente profissional, imagino eu.
Aqui nas grandes cidades do Brasil parece que chega a ser um "mico" possuir apenas uma emissora de AM, ao menos para a maioria dos radiodifusores. Eles parecem sonhar apenas com os grandes lucros que podem aferir transmitindo em FM.
O mercado está supervalorizando o FM e menosprezando o AM. Um dos poucos, para não dizer os únicos, que valoriza o AM são Antonio Augusto Amaral de Carvalho, o Tuta, da Jovem Pan e a EBC, do Governo Federal. Mas citá-los é quase chover no molhado. Um sabe porque apoia o AM e o outro tem quase a obrigação de fazê-lo.
Pelo cheiro da brilhantina, a praça de São Paulo vai ser dominada por emissoras jornalísticas e "customizadas". Mas ainda é carente em um segmento que é natural numa grande cidade: as rádios "especializadas". Existe a Cultura FM - Fundação Padre Anchieta, que só toca música erudita, a exemplo da WQXR, da prefeitura de Nova York e da rede pública BBC Radio 3, da Grã Bretanha. Há quem lembre a Nova Brasil FM, que só toca música brasileira. Mas não vale como exemplo porque as emissoras ditas populares também tocam música brasileira. Só que de um nível não muito alto. Mas fiquemos com a Cultura FM que é ainda o exemplo mais visível do que é uma rádio segmentada, que serve de referência para outras estações, ainda que estas não sejam de música erudita.
O importante é que o rádio está mudando, a concorrência vai ficar infinitamente maior. O radiodifusor que não observar esses sintomas e não levá-los a sério vai ser engolido pelas webradios, podcasts, etc. O Estado (poder público) comete o grave erro de não incentivar a produção de conteúdo para o AM e faz vistas grossas ao fato de várias emissoras o terem "abandonado". Estão todos correndo para o FM, na certeza de que o plano de digitalização do rádio não vai vingar. Não confiam na estratégia governamental. Entretanto, não se tem notícia de algum empresário que tenha devolvido sua concessão de AM para ficar apenas com o FM. Se assim o procedessem, abriria espaço para a criação de emissoras universitárias, públicas ou que pertencessem a ONGs sérias, despreocupadas com momentâneos baixos índices de audiência do AM e focadas no conteúdo de qualidade.
Todos os "players" do mercado terão de se definir quanto ao conteúdo, ao segmento e em qual mídia vai atuar. Se atuar em mais de um formato, terá de fazer conteúdos diferentes para cada um deles. E é essa é a grande mudança a que me refiro. Se aqui no Brasil será para melhor ou para pior, ainda não se sabe (afinal, aqui é Brasil). Mas com certeza a mudança começou a acontecer. O case Estadão/ESPN/Eldorado/Brasil 2000 é apenas mais um sintoma disso tudo.
4 comentários:
Espetacular o seu texto companheiro...relata exatamente o que vive o Radio AM atualmente...atuo a 30 anos no AM, vi muitos profissionais mudando para o FM prevendo a falencia do AM...Ainda não perdi a esperança...vamos esperar...
Marco Ribeiro,
Você é o Coqueiro ?
Que era diretor dos Radialistas ?
Abraço !!
Paulinho Meira
Se for, me escreva paulinhomeira@hotmail.com
Não, Paulinho, eu não sou o Coqueiro, nem nunca tive a honra de dirigir os radialistas(?).
Sim, depois desses avanços tecnológicos, aos quais todos nós estamos expostos, o rádio nunca tinha se visto tão obrigado a reformular sua conduta.
Na minha modesta opinião, o rádio brasileiro ainda é muito limitado em termos de segmentação. Não apresenta vários estilos como encontramos nos Estados Unidos ou na Europa. Temos muitas emissoras explorando mercados semelhantes e um grande enxame de outras voltadas para a religiosidade.
Pra citar a minha localidade que é o Rio de Janeiro, posso afirmar que, infelizmente, não temos mais a variedade que tínhamos nos anos 70/80/90 nas duas frequências (AM e FM).
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