Manias, gerundismos e outros "ismos" à parte. A última flor do Lácio sofre na mão de seus falantes. Eu nunca cheguei em qualquer lugar da minha cidade - ou de qualquer outra cidade - para perguntar as horas a um transeunte e este me responder: São 11 da noite mais 40 minutos. Lembro me de que, certa vez, ao perguntar as horas a um colega do departamento de esportes da Rádio Globo em um dos sinuosos corredores da sede da emissora, em São Paulo, meu interlocutor disse: "Olha, no meu relógio faltam 20 para meia noite, mas acho que ele está muito atrasado. Se você for tomar o Metrô, corre. Se não você perde o último trem." acrescentou o solícito colega.
Qual não é a minha surpresa ao constatar que, alguns dias depois deste ocorrido, este nobre colega passa a apresentar seu programa dizendo: "Boa noite, ouvinte. São 8 da noite mais 43 minutos". Confesso que senti um arrepio na espinha com tamanha novidade "linguística". Afinal, conhecia de cor e saltaeado todas as regras e recomendações do Manual de Redação e Estilo da Rádio Jovem Pan - o segundo livro deste gênero lançado por um veículo da Imprensa Brasileira - o primeiro fora o da Folha de São Paulo. Por que ele não disse apenas "são 8 horas e 43 minutos", ou ainda "8 e 43", ou sendo mais preciso "20 horas e 43 minutos"? Poderia simplesmente dizer "faltam 17 minutos para as 9 da noite". Afinal não foi assim que este colega tão solicitamente outrora me informara as horas?
Surgiu ao longo daquele turno de trabalho, uma shakespiriana dúvida a respeito da nova forma de se dizer as horas. Eu e os então colegas de redação chegamos até a consultar o grande Honorê Rodrigues, professor de direito e profundo conhecedor do idioma Português falado no Brasil. Afinal ele fora por muitos anos locutor da Rádio Eldorado e atuou lado a lado com Sergio Viotti, Rubens de Falco, Boris Casoy, Paulo Autran, Ivan Machado de Assis e uma grande constelação de vozes marcantes da emissora do Estadão desde sua fundação, em 1958, até o final da década de 80.
Ao final de uma longa reflexão, o grande sábio sentenciou: "Olha, gramaticalmente não há nada errado a rigor. Mas que é muito cafona anunciar as horas desse jeito no rádio ou pessoalmente, isso é. E o pior que, do jeito que esses modismos vem e não vão, esse vai demorar a passar."
Dito e feito. Depois daquele maldito dia, todos os repórteres e apresentadores começaram a dar as horas assim: "São 10 da noite mais um minuto". Foi pior do que a praga do gerúndio. Nem o esporte da Jovem Pan, tão zelosa no uso do nosso idioma pátrio, conseguiu escapar. Foi pior do que o "gerundismo dos atendentes de call center".
De uns 3 anos para cá, parece que o modismo incômodo arrefeceu. Mas eis que, nesta quente noite paulistana, ouço um certo repórter soltar a seguinte pérola: "amigo ouvinte da Bandeirantes, são oito da noite mais 29 minutos". Ah, meu São Landel de Moura, que o Hélio Ribeiro, o Alexandre Kadunk e minha Santa mãezinha não tenham ouvido essa lá no céu. Se fosse na CBN, a famosa e simpática dona Nadir certamente ficaria em dúvida se era pra tomar seu remédio ou não. Se fosse na Rádio Globo, fazer o quê, né? Mas na Bandeirantes que tem ombudsman e o Salomão Esper? Ai ai ai ai ai ai. Será que este modismo vai voltar? Valei-me, meu São Roquete Pinto!!!!!!!!
4 comentários:
Rapaz, se você ouvir rádios do interior do País, vai ver que esse "formato" de dizer as horas é extremamente comum. Assim que me mudei para uma cidade do interior, ouvi um locutor amigo meu dizer "agora são 22 horas e 15 minutos". Na minha humilde opinião acho que dizer as horas dessa forma soa muito formal e resolvi perguntar por que ele não disse apenas dez horas e 15 minutos. Ele me respondeu: "Uai, é para o ouvinte não confundir com dez da manhã..."
E juro que isso não é piada...
O seu locutor amigo não está errado, Marcelo. Esta seria a forma mais correta. Agora "10 da noite mais 15 minutos" é invencionice, cujo autor atende pelo nome de Márcio Bernardes, que hoje trabalha na Transamérica. E o pior que a equipe toda de esporte começou a usar esta forma ridícula e tem locutor usando até hoje. Lamentável.
Esse texto eu também vi no blog da Magaly Prado. Nos dois lugares, sem crédito pra ninguém. Quem está copiando quem?
Ok, eu errei. Acabei de ver que ela deu crédito a vocês. Desculpe.
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