domingo, 11 de novembro de 2018

Destruo e Mato Culturalmente




Por Fernando Jorge*

Realizei uma palestra na Universidade de Santo Amaro, a convite de Wagner Belmonte, dinâmico professor de Jornalismo, e nessa ocasião um estudante me perguntou:
–O idioma português, mais do que os outros idiomas, ajuda o plagiador a plagiar?

–Em todas as línguas é possível plagiar – respondi – mas eu creio que as dotadas de maior plasticidade, como é o caso do idioma francês, podem ser mais úteis às rapinagens dos ladrões literários.

Depois de ter assim me expressado, citei o Dictionnaire des plagiaires, de Roland de Chaudenay, obra lançada em Paris no ano de 1990 pela Editora Perrin, onde o autor enfileira dezenas de roubos literários cometidos por escritores da pátria de Voltaire.

Mas cheguei a esta conclusão: a língua portuguesa é também um dócil instrumento nas mãos dos plagiadores. Por quê? Devido ao fato de ser uma língua maleável, riquíssima em sinônimos, em locuções que se assemelham a outras locuções. José Alves Fernandes, professor emérito da Universidade do Ceará, mostra essa opulência no seu excelente Dicionário de formas e construções opcionais da língua portuguesa (Edição da EUFC, Fortaleza, 2000). 

Vejam, por exemplo, estas locuções oriundas do verbo dizer, citadas pelo professor na página 21 do seu trabalho:
A bem dizer – Ao dizer – Bem dizer – Digamos assim – Para assim dizer – Para bem dizer – Por assim dizer – Por bem dizer – Porque assim digamos. São locuções empregadas por grandes vultos da literatura luso-brasileira, como Alexandre Herculano, Latino Coelho, Camilo Castelo Branco, Machado de Assis, Rui Barbosa. E graças a esta maleabilidade da língua portuguesa, a esta sua fartura, os plagiários logo se apoderam dos textos alheios, fazendo hábeis mudanças, alterando esses textos com adjetivos sonoros e frases retóricas, roubando informações inéditas, extraídas de teses, de ensaios, de artigos, de reportagens, sem jamais citar as fontes.

Quem tinha o costume de pegar frases de poetas, de filósofos, de estadistas, de escritores, e exibi-Ias como sendo de sua autoria, era o Paulo Francis. Provei isto documentadamente, de maneira insofismável, no meu livro Vida e obra do plagiário Paulo Francis - O mergulho da ignorância no poço da estupidez, lançado pela Geração Editorial, Numa entrevista publicada na edição do dia 5 de fevereiro de 1997 do Correio Popular de Campinas, o Alberto Dines declarou que o processo da Petrobrás contra o Francis, e esta minha obra, causaram-lhe a morte. 

Se a afirmativa do Dines expressa a verdade, então eu mereço aparecer no Guinnes, o livro dos recordes, porque me tornei, na história do mundo, o pai do "primeiro livro assassino”. Puxa vida! Sou pai de um "livro homicida", de um livro que tirou a vida do Paulo Francis! Juro, eu gostaria de saber se o meu livro deve ser eletrocutado, fuzilado ou enforcado. E responda-me, Alberto Dines: não é melhor, em vez de condenar a minha obra à morte, enfiá-la na Penitenciária Bangu I, de segurança máxima?

Imagino como eu me sentiria, ao descobrir que um plagiador cravou os seus dentes pontiagudos de vampiro neste meu artigo. A comparação não é despropositada. Todo plagiador é um Drácula e os nossos textos contêm o rubro e quente sangue da nossa inteligência, da nossa cultura, da nossa capacidade criadora.

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*Escritor e jornalista, Fernando Jorge é autor do livro As lutas, a glória e o martírio de Santos Dumont, cuja 7ª edição acaba de ser lançada pela editora Harper Collins Brasil


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