Como o caro leitor já deve ter se informado pela internet, os funcionários da Rádio Record, de São Paulo, uma das emissoras mais antigas do Brasil, que hoje pertence ao grupo ligado à Igreja Universal do Reino de Deus, foram demitidos na última sexta feira.
No que pese o fato de colegas jornalistas e radialistas terem perdido o seu precioso "ganha-pão" - o que é lamantável -, de renomados comunicadores populares simplesmente terem suas atrações - mesmo gerando um bom faturamento para a emissora - retiradas do ar, e a conturbada trajetória em que se envolveram os líderes daquela denominação religiosa, arranjando animosidades com outros veículos de comunicação e até mesmo com igrejas de outros segmentos cristãos, há uma reflexão seríssima que se faz muito necessária agora:"O rádio AM está mesmo sendo extinto ou é falta de visão dos empresários de comunicação?"
Os que defendem e que se declaram apaixonados pelo rádio AM, costumam dizer que há um complô para acabar com essa faixa de frequência porque operar em FM é muito mais barato e precisa de menos recursos financeiros e humanos para tal.
Seus opositores alegam que transmitir em amplitude modulada já está ultrapassado tecnologicamente falando, até porque nenhum fabricante de equipamentos eletro-eletrônicos produzem mais aparelhos receptores de rádio com as faixas do AM (Ondas Curtas e Ondas Médias).
De fato, estes têm razão. Nas grandes capitais está cada vez mais difícil ouvir rádios AM, que sofre muitas interferências eletromagnéticas de toda a espécie. Além disso, as novas gerações de ouvintes foi criada ouvindo FM. Precebendo isso, as principais emissoras do país começaram um processo de "duplicação" de programação, retransmitindo o som do AM no FM. A pioneira nesse processo foi a Rádio CBN de São Paulo, em 1996.
Com o tempo, Itatiaia, Gaúcha, Bandeirantes, Guaíba e outras emissoras de rádio especializadas na programação jornalística tornaram suas AMs meras repetidoras da programação que agora é gerada em frequência modulada. Posteriormente, emissoras populares como a Rádio Globo e a Rádio Tupi, ambas do Rio de Janeiro, iniciaram suas "transmissões simultâneas" em AM e FM.
Em 2006, foi a vez da Rede Bandeirantes de Rádio criar a "Band News FM", com programação baseada na emissora americana "1010 WINS", emissora AM Nova York - com notícias curtas e minijornais que se repetem e são atualizados a cada 20 minutos. "Só notícia, só FM". Esse é um dos slogans da nova rede noticiosa, como se quisera deixar bem claro que, para o Grupo Bandeirantes, o AM está definitivamente morto e enterrado.
Apesar da mais nova baixa, duas das principais rádios AM de São Paulo ainda resistem, mas não se sabe por quanto tempo: Jovem Pan e Capital. Na Capital, até onde se sabe, não há menção de se fazer sua transmissão também em FM.
Na Jovem Pan, depois do fiasco da tentativa de implantação de um sistema digital para esta faixa por parte do governo federal, Antonio Augusto de Amaral de Carvalho, o Tuta, presidente da emissora, admitiu em entrevista à Rádio Bandeirantes que o AM está definitivamente com os dias contados.
É possível que ele esteja procurando uma emissora FM para retransmitir a programação da Jovem Pan. Ou que ainda use a sua própria estação de frequência modulada para tal, como já faz ao retransmitir o "Jornal da Manhã" e as jornadas esportivas. Se pensou nisso, talvez não o tenha feito ainda porque a Jovem Pan FM, comandada há mais de 30 anos por seu filho, Tutinha, é líder de uma rede de programação musical jovem de grande audiência e influência - e que tem um alto faturamento, a exemplo da "irmã" AM. Não me parece que "seu" Tuta e seus familiares cometam o desatino de tirar a "Jovem Pan 2" do ar, apenas para "ficar na moda" ou "reposicionar sua marca no mercado" radiofônico, digamos assim.
Ainda há a possibilidade de Tuta acreditar no rádio AM pelo fato deste ser um veiculo propício à conversa, ao bom "bate-papo", à voz humana enfim, em detrimento de suas características não favorecerem a veiculação de músicas, dada à sua baixa qualidade de reprodução sonora frente ao FM. Afinal, o diretor da Jovem Pan é um dos poucos executivos que conhece a fundo as questões técnicas que envolvem as transmissões de rádio e tv. Haja visto a ótima performance que as suas emissoras sempre tiveram, mesmo na época em que ter um equipamento de ponta era privilégio de grandes radiodifusores. Talvez seja por tudo isso que a Jovem Pan AM sobreviva e que as suas concorrentes estejam sucumbindo.
O fato é que a maioria das outras emissoras erraram onde a Jovem Pan acertou. Quando o FM começou a despontar com grande força na audiência, a maioria das empresas de radiodifusão no grandes centros, simplesmente deixou o rádio AM de lado. Não investiram em tecnologia nem em programação como deveriam. Enquanto estava dando dinheiro e prestígio, iam empurrando com a barriga. No momento em que não deu mais, plugaram a mesa da AM no FM.
Não dá para entender o que acontecera na Record, à primeira vista. A emissora, mesmo transmitindo em AM, possuía 200 Kw de potência, contava com alguns nomes consagrados do segmento popular, como Gil Gomes, Kaká Siqueira, João Ferreira, Leão Lobo e Paulo Barboza, líder de audiência - e faturamento - na faixa do AM, há mais de 25 anos, e que conta com um público cativo, aonde quer que ele vá.
A Record ainda contava com a parceria da Transamérica, na programação esportiva, que deve ter levado para os 1000 Khz, outra carteira de anunciantes de peso. Definitivamente a Record não era uma rádio que estivesse entregue à sua própria sorte. Tinha um público tão grande quanto aqueles que ouvem as emissoras populares FM líderes das pesquisas.
Há quem diga que eles vão passar a programação da FM do grupo (99,3 MHz, em São Paulo) para a finada Rádio Record AM e que no lugar dessa surgiria a Record News FM, nos mesmos moldes da Band News. Se realmente acontecer isso, por que as equipes técnicas e de jornalismo foram demitidas? Será que a experiência deles na empresa não lhes será útil na suposta nova "empreitada"? E se a Record tinha comunicadores que atraíam a audiência e, consequentemente, receita publicitária, como podemos supor, por que dispensá-los desta forma? Vão tirar as grandes atrações para tocar "música e notícia"? Esta conta não fecha.
Talvez esta reportagem do recém inaugurado portal F5, da Folha de São Paulo, explique a atual conjuntura e seja uma das chaves deste mistério todo. No texto, o seu autor, Ricardo Feltrin, descreve aquilo que seria uma grande briga interna de poder dentro da Igreja Universal do Reino de Deus para saber quem vai controlar os destinos da Rede Record de Televisão. Isso nos autoriza a pensar que, nesta referida briga, tenha de algum modo - e não me pergunte como - sobrado para a Rádio Record AM. É esperar para ver como termina esta história.
Nenhum comentário:
Postar um comentário