quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

O estado atual do nosso rádio 2 - ou - um tatu cheira o outro

Meu caro Marcos,

Diga para seu amigo não se desesperar que hoje em dia a mídia é assim mesmo. Nem sempre quem tem mais talento ou competência consegue um estágio. Afinal, a gente nem sabe mais o que os selecionadores querem dos candidatos. Devem ser formados em marketing, como diz Juca Chaves. O menestrel costuma dizer que, quando ele apresenta um projeto artístico que quer que seja aprovado pela empresa, ele procura qualquer diretor, menos o de marketing. Brincadeiras à parte de nosso amigo narigudo, é quqase isso.

Certa vez, um primo meu que mora lá no Rio de Janeiro foi participar de uma seleção para motorista de ônibus coletivo lá em Duque de Caxias. Depois de 3 fases de seleção, o selecionador disse a ele e aos demais que última prova escolheria quem ficaria com a vaga. Dentre vários exercícios sem pé nem cabeça, pediram que desenhassem um homem atrás de uma árvore. Claro que todos desenharam uma cabeça e um braço dando adeus atrás de uma árvore. Ele fez diferente: desenhou o homem inteiro em pé, com um dos sapatos sobre a árvore, que estava no chão. O selecionador reclamou disse que não era isso que havia pedido. Ele retrucou: "Foi isso sim, só que você não disse que a árvore tinha de ficar em pé, não é? O selecionador concluiu que meu primo tinha uam certa dificuldade em se relacionar com superiores porque não fazia o que se pedia (?). "Vem cá, mas a vaga é pra desenhista de Gibi ou motorista de coletivo? Se for pra motorista, me dê um ônibus pra dirigir, que aí eu mostro o que sei fazer. Afff", retrucou.

Dias mais tarde, ligaram pra ele da tal empresa e ele foi chamado pra fazer o teste prático na garagem. Ele foi, conversou com o chefe da garagem, saiu com um carro reserva e fez o teste direitinho. No final, o tal chefe disse: "Para quem não tem muita prática com ônubis grande até que você dirige bem e conhece a cidade. Tá contratado. Mas por que o pessoal dos Recursos Humanos demoraram tanto pra te chamar? ", perguntou o homem. "Acho que foi pelo fato de eu ter desenhado a tal ávore deitada no teste escrito", respondeu meu primo. O funcionário não entendeu nada e nada mais quis saber sobre o assunto.

Isso é só um exemplo de como certas empresas não tem noção do que querem. Querem um motorista, ams querem um que entenda de desenho artístico. Para que, ninguém sabe.
Agora tem empresa que sabe o que quer, mas à vezes a coisa não rola. Olha só o que eu achei em nossos arquivos a seguinte história.

*


Meu encontro com Humberto Marçal

Cláudio Roberto Silva
De São Paulo

Em 1992, vindo de Alagoas, para tratar de meu filho, que na época tinha apenas 2 anos e meio de idade e era portador de um tipo de câncer raro, tive que procurar trabalho em minha área. Quando cheguei a São Paulo, havia trabalhado durante muitos anos em rádios do meu Estado. Depois de procurar trabalho em várias emissoras de São Paulo e não encontrar, fui indicado para procurar o nosso inesquecível Humberto Marçal, que na época trabalhava na Rádio Record, quando era na Avenida Miruna, no bairro do Aeroporto.

Ao ser apresentado a ele, confesso que fiquei bastante nervoso, pois a fama dele era grande, mas de um excelente profissional e que gostava de ajudar outros companheiros de profissão. Lembro como se fosse hoje. Depois de conversar com ele por alguns minutos, resolvi lhe mostrar o meu curriculo. Porém, para a minha surpresa, ele com aquele seu jeito de mineiro - não sei até hoje onde ele nasceu - me disse secamente: "Não gosto de dar atenção a papel. Vamos ver na prática do que você realmente é capaz.
Em seguida, ele me levou até a sala de produção e pediu que eu fizesse quatro textos para rádio. Esporte, política, economia e geral. Dito isso, ele saiu da sala e disse: "Fique tranqüilo, volto em trinta minutos para ver o que você escreveu".

Confesso, que fiquei com tanto medo que travou completamente meu cérebro. Parei um pouco para respirar e pedi a Deus que iluminasse minha cabeça, do mesmo jeito em que Ele iluminou os olhos de Paulo com um relâmpago. Parece que aconteceu um verdadeiro milagre. Fiz os textos que o Marçal havia pedido em apenas 15 minutos. Ao retornar a sala, ele pegou os textos e começou a ler atentamente. Com uma caneta, ele começou a fazer alguns rabiscos. Juro que fiquei sem forças nas pernas. Ele seria a minha única esperança em encontrar trabalho em São Paulo.

Ao terminar de corrigir os textos, ele falou: "Garoto, onde você aprendeu a escrever dessa maneira? Quase sem fala, eu disse: "A minha escola foi no rádio alagoano, tive professores como Márcio Canuto (hoje) na Rede Globo de Televisão". Ao ouvir isso, Marçal olhou para mim por alguns instantes e disse: "Garoto, eu gostei do seu jeito meio matuto, mas também vejo que você tem muita garra e promete muito. Você está empregado. Volte aqui na segunda-feira para começar a trabalhar comigo.

Esta foi a frase mais importante que eu ouvia nos últimos tempos. Ao sair dali, tratei logo de encontrar uma igreja para agradecer a Deus, pois tinha a certeza de que era um milagre. Lembro que fui até a Igreja de Nossa Senhora dos Homens Pretos, que fica no Paissandu. Rezei muito e agradeci a Deus por aquela bênção. Naquela época eu morava no Jardim Guarani, zona norte da capital. Ao chegar em casa fui logo contando que estava empregado na Rádio Record.

Mas a minha alegria foi tão grande ao ouvir a afirmação de que estava empregado, que esqueci de perguntar o horário em que deveria chegar na segunda-feira, já que esse encontro aconteceu numa sexta-feira. Tentei falar com ele ainda no mesmo dia, mas não consegui. Deixei para o sábado e também não consegui. Só me restava uma saída: chegar lá na segunda-feira o mais cedo possível.
Porém, como nem sempre as coisas acontecem como a gente quer, na segunda-feira, meu filho que tinha câncer não passou muito bem à noite anterior e tive que levá-lo ao Hospital das Clínicas, logo cedinho. Como não deu para retornar no dia marcado, resolvi ligar para ele e tentar explicar os motivos de minha ausência no meu primeiro dia de trabalho.

O que vou narrar agora, parece brincadeira, mas foi a pura verdade. No final da tarde da segunda-feira, liguei para a rádio.
Foi dessa maneira dialogo comigo e a a recepcionista:

Por favor, eu gostaria de falar com o Sr. Humberto Marçal:
Ela responde: Só se for no Céu.
Eu digo: Por favor, não brinque comigo, isso é importante. O assunto é de vida ou de morte.
Ela diz: Por isso mesmo. Se o senhor desejar mesmo falar com o Marçal deve ir ao Céu, poie ele morreu.
Sem entender nada, perguntei: Mas, morreu como?
Ela diz: Ora, morrendo. Ele morreu no último final de semana. Teve um problema de coração.

Essa foi a notícia mais triste que eu havia recebido nos últimos tempos. Tão triste como a que recebi dos médicos, quando me informaram que o meu filho estava com câncer e tinha apenas seis meses de vida. Ao ouvir as palavras da recepcionista, comecei a chorar desesperadamente, não pelo fato de não poder trabalhar na Rádio Record, mas por perder prematuramente um amigo que acabara de ganhar. Um homem que tinha um coração cheio de amor e compreensão. Marçal foi embora para sempre, mas ficou na minha memória a imagem de alguém que era acima de tudo, humano. Essa lembrança que guardo até hoje do amigo Humberto Marçal, tinha um dia de ser contada a todos aqueles que assim como eu, aprenderam a admirar e a respeitar o ser humano e profissional que foi Humberto Marçal.

Cláudio Roberto Silva

*

Pois é, coisas da mídia.

2 comentários:

Anônimo disse...

Gostamos muito desta história relatada, apesar de ser um pouco triste tem uma mensagem de esperança.Quanto experiência do seu primo, passamos por uma situação parecida. Fazendo um paralelo com as duas histórias citadas, no nosso caso,"Deus"nos perdoa, preferiamos que as pessoas envolvidas não deveriam nem ter nascidas !
Abraços !

Marco Antonio Ribeiro disse...

É que nesses casos, equipe, às vezes, a parteira se engana: joga o bebê fora e dá a placenta para a mãe criar. E dá nisso, né? Gente totalmente "sem-noção".