sexta-feira, 30 de abril de 2010

Monte uma rádio pirata na panela de pressão

por Rubens Leme da Costa
do blog Schopenhauer Perde


Na tediosa noite de Ribeirão Preto à caça de uma rádio que tocasse alguma música que prestasse, comecei a virar o dial quando ouvi um barulho estranho: voz baixa, sinal idem e duas canções de Raul Seixas - "Mosca Na Sopa e "Mamãe eu não queria (servir o Exército)". Não bastasse serem duas músicas proibidas pela censura militar o locutor tinha uma voz de adolescente e dava boa-noite dizendo que a Rádio Tal voltaria amanhã. "Meu Deus", estremeci, "uma rádio pirata!"

No dia seguinte, haveria a aula de literatura e precisávamos levar uma notícia qualquer e apresentá-la aos demais. Quando contei, ninguém acreditou. E aquilo me marcou.

Passa-se um tempo e comentei com o Adriano o acontecido. Não sei como, mas ele tinha um folheto ou revista falando exatamente do assunto. E não era só. Existia um manual que ensinava a montar vários tipos de rádios piratas, inclusive em uma panela de pressão!

A coisa era o seguinte: você comprava os equipamentos, montava tudo e com a panela você ia se deslocando para atingir novos lugares. Segundo o folheto, a potência dava para cobrir um raio de 100 ou 150 metros. Eles explicavam que era bom você trocar sempre de lugar para não ser rastreado e, eventualmente, preso.

Claro que era um absurdo, mas eu perguntei pro Adriano porque não comprávamos o tal kit de montagem. "Rubinho, a gente manda o dinheiro numa carta e nunca mais o verá". "Ah, vamos arriscar". E arriscamos.

Semanas depois, Adriano me liga eufórico dizendo que o kit havia chegado. Oba! E agora?

Ficamos ansioso e começamos a conversar, imaginando quais seriam nossos próximos passos...

"Mas Rubinho, precisamos de uma panela de pressão!"
"Eu sei, Adriano. Pegamos da sua mãe ou da minha?"

Como dona Helena era mais mansa, optamos por sequestrar a panela de minha mãe. "Então, teremos que fazer em casa."

Fomos até minha casa, passei pela cozinha, sumi com a dita e entramos no meu quarto. Quando abrimos o pacote, uma decepção: tudo era complicado e não tínhamos equipamento específicos como um soldador, chaves, além de nenhum conhecimento de eletrônica.

Enquanto confabulávamos o que fazer - chamar um conhecido que manjava de rádios era a melhor opção -, alguém entra no meu quarto.

"Rubinho, meu filho, o que você está fazendo com minha panela de pressão?"
"Ah, oi mãe. É... uma experiência, mãe."
"Que experiência?"
"Estamos montando uma rádio pirata..." (Adriano quase se enfiou embaixo da cama envergonhado... "cala a boca, Rubinho!")
"Uma, o quê?"
"Uma rádio, mãe!"
"Uma rádio? Como assim, uma rádio? Do que você está falando?
"Oras, mãe to falando de uma rádio!" (Adriano quase se joga da janela...)
"Rubinho, você tá tirando uma comigo?'"
"Não, mãe, to falando sério".
A essa altura nem eu conseguia mais ficar sério perante tal diálogo absurdo. Mas ela prosseguiu...
"Tá bom. Vamos dizer que eu acredito que vai montar uma rádio com uma panela de pressão. E ela vai funciona como, com gás?"
"Não, mãe, ligo na tomada!"
Minha mãe apenas olha pra mim com uma cara de riso...
"Sei... você liga a panela na tomada... ô, meu filho, você andou bebendo novamente?"
"Não, mãe! Que coisa!"

E com aquele ar de quem não estava querendo explicação alguma, já que seria impossível entender o que eu falava, minha mãe apenas pegou a panela e a levou para a cozinha.

E minha vida de DJ, que mal havia começado, terminou...

Ah, sim... o Adriano permanece vivo...

3 comentários:

Marcos Lauro disse...

Sensacional!

Oficina de Capacitação de Radislistas Comunitários disse...

Gostei da história e postei no www.abracocentrooeste.ning.com para que as Rádios Comunitárias do Brasil a conheçam. ABRAÇO FORTE

Anônimo disse...

eu gostei muito dessa ideia de montar uma radio detro de uma panela de presão