domingo, 16 de dezembro de 2007

"Na TV é só bunda, professor", reclama Cauby

Gravuras, recortes de jornais, capas de revista, fotos, vídeos e até uma vitrola muito antiga, com todos os discos de sua carreira, no Centro Cultural da Caixa Econômica Federal, no centro de São Paulo. Ao longo de 55 anos de carreira, estes objetos estamparam o rosto de um dos maiores cantores da música brasileira de todos os tempos ainda vivo: Cauby, ele mesmo, o da família Peixoto.

Este artista teve o privilégio de atravessar o século e ser contemporâneo de grandes inovações tecnológicas para se ouvir música, como o Ipod e o mp3. Mas sua fidadelidade ao rádio, veículo que o projetou nacionalmente a partir de São Paulo, é canina. "Eu não vejo mais televisão. É só bunda, professor," sentencia ele, com a voz mansa e baixa que contrasta com o potencial vocal que libera somente quando é hora de cantar. "Ligo a TV de vez em quando só para assistir aos meus amigos," completa este senhor, fã e admirador confesso de Frank Sinatra, "the blue eyes", outro vozeirão da categoria de Cauby.

"Esse meu jeito de falar aprendi com o povo de São Paulo. Quando cheguei aqui, este povo me chamou a atenção pela elegância das roupas, pelo jeito de falar, de andar, tudo muito chique, muito bem arrumado. Aí eu percebi que se quisesse cantar para este povo, teria de ser elegante também," revela. Cauby deve muito mais a São Paulo do que seu jeito de se portar e de se comportar em palco e em público. Aqui ele começou sua brilhante carreira de quase 60 anos. "Devo muito a São Paulo. Quando saí de Niterói, em 1953, passei pelo Rio de Janeiro rapidamente e vim para cá tentar a carreira e aqui aconteci nas boates, casas noturnas e depois no rádio. Daqui, a minha carreira decolou e, graças a Deus, não caiu mais. Sou o Frank Sinatra brasileiro e acho que sou muito bom," brinca ele, com um leve e discreto sorriso para alegria de seus interlocutores.

"O rádio foi muito importante porque cheguei às pessoas mais humildes através dele. Ainda hoje gosto de ouvi-lo porque o rádio é o meio de comunicação mais democrático. Ele mostra tudo o que acontece no mundo da música, muito mais do que a televisão", explica.

Mesmo tendo tanto apreço ao que é chique e glamouroso, Cauby nunca se esquivou do seu público mais humilde. Sempre cantou aquilo que o coração e o feeling de artista mandava, não se importando que o chamassem de brega por cantar essa ou aquela música de um repertório não tão "elitista". "Alguns anos atrás, a música 'dor de cotovelo' era considerada brega, de mau gosto. Mas era popular e eu sempre gostei de cantá-la porque era linda. E eu não tenho preconceito musical e o público gosta disso. Não tem essa de 'brega'".

Seu pocket show, realizado ali mesmo instantes após a coletiva, Cauby capricha no curto repertório para a seleta e fiel platéia que ali compareceu para a exposição sobre sua obra e sua vida. Standards americanos, "Samoa", "Se todos fossem iguais a você", "Como uma onda", "Ninguém é de ninguém", sem esquecer as eternas "Conceição" e "Bastidores"("nos shows o pessoal sempre me pede:'canta Camarins?'", comenta ele) fazem parte de seu show.

Ao fim do show, ele sai amparado por seus amigos, tal com chegou. Sua fragilidade para andar é proporcionalmente inversa ao poderio de sua voz no palco que enche o auditório com seus timbres e sua afinação. Afinal, Cauby será sempre Cauby.

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