segunda-feira, 12 de janeiro de 2004

Ser deficiente em São Paulo ( e ouvir rádio)

Geraldo Nunes
Repórter Aéreo da Rádio Eldorado

Nasci em São Paulo, fato que no entanto não impediu que eu contraísse a paralisia infantil. Pode parecer incrível, mas um médico orientou meu pais para que não me vacinassem enquanto eu estivesse com a garganta inflamada. Isto aconteceu em 1959, quando eu tinha apenas um ano e meio de idade. Fiquei paraplégico e só consigo caminhar com a ajuda de aparelhos ortopédicos.

Perdi algumas coisas por ser um portador de deficiência, mas descobri outras. Aprendi desde cedo a conhecer a cidade, porque minha mãe me levava de um lado para o outro, atrás de meus tratamentos médicos. Descobri São Paulo muito cedo e passei amá-la ainda criança.

Lembro-me da porteira do Brás e de vários casarões da Paulista. Vivi a reportagem e o rádio também muito cedo. Eu não podia correr como as outras crianças. Em minhas horas vagas brincava de apresentador de telejornais e ouvia rádio. Um de meus programas favoritos era O Trabuco, mas não perdia Histórias das Malocas, com Adoniran Barbosa.

Jamais esquecerei do melhor presente de aniversário que já ganhei quando completei seis anos, um rádio de pilha.

O tempo passou e assim que pude me tornei jornalista e profissional de rádio, onde trato em meus programas de assuntos voltados à cidade como o trânsito, as edificações e a educação. Meu objetivo é o de incutir nos professores, a necessidade de ensinar os alunos a amar São Paulo. Pode parecer estranho a alguns, ser apaixonado por uma metrópole cheia de mazelas e preconceitos como a nossa, mas no meu caso minha paixão veio dos céus, a bordo de um helicóptero onde vejo a cidade todos os dias para falar primeiro do trânsito. Mas sempre sobra tempo para ver a cidade como ela é, naquilo que ela tem de bom e de ruim.

As maldades de São Paulo, nascem do desamor, do interesse sórdido de apenas lucrar, pois é que aqui onde tudo se faz e onde tudo acontece que se encontra o lucro. São Paulo é a terra do dinheiro e pelo dinheiro poluem – se os rios, o ar, desmata - se a Cantareira, inverte-se o curso do Pinheiros que vai poluir a Billings e o estuário de Santos.

São Paulo também é a sorte dos construtores de grandes edifícios e a chance de dias melhores, até daqueles que dormem sob as marquises e os viadutos. São Paulo é iluminada nos Jardins, florida no Arouche e viva na Paulista. São Paulo é sórdida por trás dos muros que antecedem a Guarapiranga, onde joga-se o lixo não reciclado e cruel nas filas dos ônibus, dos hospitais e nos pavilhões da Detenção. Na cidade onde mata-se por um par de tênis, existe muita vida no recreio dos escolares, na juventude universitária e nas múltiplas raças, vindas de todas as partes do mundo, buscando a cidade para crescer.

São Paulo tem defeitos? Quem não os têm. Então, porque não aprender para depois ensinar nossos os nossos alunos a amar esta cidade. Sendo assim, Viva São Paulo !


Texto integrante do web site SP 450

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